O pensamento perceptual no autismo
- Pandorga Formação Autismo
- 28 de fev.
- 3 min de leitura
Talvez, ao chegar aqui, você já saiba que pessoas autistas pensam de modo diferente das pessoas típicas. Pensar de modo diferente envolve diversas caraterísticas que estão, ao mesmo tempo, todas interligadas. Uma das principais características deste modo de pensar é o foco no detalhe (que, de forma menos positiva, também pode ser chamado de fraca coerência central).
O pensamento perceptual no autismo

Podemos olhar para esta característica a partir de outro ângulo e considerar que pessoas com autismo têm um pensamento perceptual. O que isso significa? Que todos os detalhes que a pessoa capta são informações assimiladas através dos cinco sentidos: visão, tato, audição, olfato e paladar. Ou seja, são percepções. Além disso, de certa forma, essa profusão de detalhes “ocupa muito espaço”. Consequentemente, o pensamento fica condicionado, em maior ou menor grau, pelas percepções.
Porém, o que acontece muitas vezes é que o pensamento das pessoas autistas estaciona na informação que recebe dos sentidos e não vai além dela. O psicólogo americano Jerôme Bruner chamou isto de não “ir além da informação dada” (go beyond the information given). A informação dada são as percepções, a informação perceptual; e o que está além dela é o significado e o contexto.
Então, é muito comum que, na sua compreensão de mundo, a pessoa autista não se guie pelo significado e pelo contexto, mas apenas pela percepção.
Como é que o pensamento perceptual se manifesta na prática?
O teste da maçã, da banana e da bola
Para entender melhor o que significa ter um pensamento perceptual, observe este teste simples que é feito com crianças autistas e crianças neurotípicas.
Veja a imagem: uma maçã, uma banana e uma bola.


A instrução que as crianças recebem é reunir os objetos que fazem parte do mesmo grupo.
A maioria das crianças neurotípicas agrupa, naturalmente, a maçã e a banana, porque elas pertencem ao mesmo grupo de significado: são frutas, servem de alimento.

A maioria das crianças autistas, por outro lado, agrupa a maçã e a bola porque as duas são redondas.
Essas crianças se guiam pela informação perceptual dada pela visão, neste caso, a forma. Elas não vão além da informação dada, param na informação perceptual e não chegam até o significado.
Thomas
Thomas é o filho autista da nossa professora Hilde De Clercq e hoje ele é adulto. Esta história aconteceu logo após o nascimento dele: os efeitos do pensamento perceptual se fizeram sentir de imediato, e Thomas quase morreu por inanição.
Na primeira vez em que mamou, Hilde estava usando uma certa camisola, um certo par de brincos, uma certa fita no cabelo e um certo perfume – quatro elementos. Mais tarde, quando era hora de mamar novamente, esses quatro elementos não estavam mais reunidos (Hilde talvez tivesse trocado a camisola, ou não estava usando brincos, ou estava com o cabelo solto...) e Thomas não quis mamar. Dali em diante Thomas não mamou mais. E foi definhando.
No cérebro de Thomas, recém vindo ao mundo, a informação perceptual assumiu a dianteira: para mamar é preciso que um conjunto de elementos esteja presente – camisola, brincos, fita, perfume. Mamar não foi associado a saciar a fome, e sim às percepções que teve na sua primeira experiência de mamar. Thomas recebeu a informação perceptual e não foi além dela.
Percebe-se que ser um pensador perceptual e não ir além da informação dada pode ser bastante desvantajoso, para dizer o mínimo. É claro que nem todas as situações são tão extremas como no caso de Thomas. Juntar a maçã com a bola, em vez da banana, pode ter um impacto muito pequeno na vida de uma pessoa. Pode ser uma simples questão de ponto de vista diferente.
Comentarios