top of page

Autismo: tensões na educação

Atualizado: 27 de jun.

Quais são os direitos do estudante com autismo? Quais são as condições para ele seja incluído na escola? O que acontece quando a escola não inclui? Como funciona o roteiro da escolarização das crianças autistas? Como deveria ser a relação entre profissionais da escola regular e da escola especializada em autismo?


O presente artigo discute essas questões, tomando como base, mais uma vez, aulas da nossa professora britânica Rita Jordan, importante pesquisadora sobre autismo e possuidora de uma vasta experiência prática em salas de aula especializadas.

Autismo tensões na educação

Inclusão: tensões na educação de estudantes autistas  

A educação/escolarização de pessoas com autismo é uma área cheia de tensões. A principal delas é a tensão entre o direito a uma educação abrangente e o direito a uma educação que dê conta das necessidades especiais da pessoa.


As pessoas autistas, assim como qualquer outra, têm o direito de ter acesso ao currículo nacional amplo e relevante. Este é o currículo concebido por e para uma certa cultura e engloba o conhecimento necessário para a participação das pessoas na vida dessa cultura. Ao mesmo tempo, elas têm o direito de ter suas necessidades supridas, quer dizer, de ter acesso às especialidades educacionais capazes de atender a essas necessidades.


Porém, a condição ideal para a aprendizagem pode não ser a condição ideal para a integração social e daí resulta essa tensão. Para chegar a uma solução, precisamos ter clareza sobre nossos objetivos e prioridades. O que queremos para a pessoa autista que está sob nossa responsabilidade? Do que é que ela mais precisa? De um contexto especializado, focado na aprendizagem? Ou de um ambiente predominantemente neurotípico onde ela  vai se envolver com colegas que poderão ajudá-la a entender como circular no mundo “exterior” e como integrar-se à sociedade?


A chegada da criança na escola

Todas essas perguntas precisam ser respondidas. Uma questão básica a ser considerada nesse contexto é em que momento essas decisões precisarão ser tomadas e como vai ser a preparação para a inclusão da criança autista. Sim, porque não podemos presumir que ela será capaz de aprender em contextos de inclusão sem ter sido preparada, sem que tenha feito alguma experiência prévia no novo ambiente.


Em muitos lugares, por via de regra, a escolarização é iniciada no sistema educacional regular, como uma espécie de teste. Se a criança não se adaptar, vê-se o que fazer. No entanto, é comum que as creches ou pré-escolas do sistema regular não estejam preparadas para lidar com a criança autista, nem que a criança autista seja preparada para esse ambiente.


Nesse tipo de situação, a criança está praticamente predestinada ao fracasso. Se a criança tiver uma limitação leve, talvez até consiga dar conta da situação e se manter na escola regular; porém, são muitas as que fracassam nessas circunstâncias. Ou seja, com frequência, o caminho para acessar a escola especializada passa pela exclusão sofrida em uma escola regular e isso, evidentemente, afeta a maneira como a criança autista e seus pais enxergam a educação escolar.


Esta situação também não é positiva para os professores da escola regular porque, para eles, confirma-se a convicção de que não são capazes de lidar com essas crianças diferentes. E do outro lado do processo estão os professores especialistas que receberão uma criança que já vêm de uma experiência negativa de escola.


Experiências insatisfatórias

Em geral, autobiografias de pessoas com autismo relatam experiências de vida escolar decepcionantes e até mesmo traumatizantes. Muitos pais que têm filhos autistas frequentando escolas regulares despreparadas para atendê-los também se sentem profundamente insatisfeitos com a experiência. Alguns acabam recorrendo à Justiça para reivindicar uma escola melhor para os filhos. Geralmente o que buscam é uma escola especializada que acreditam poder dar conta do recado. E o que talvez possa surpreender é que, muitas vezes, os pais tomam essa medida em comum acordo com a equipe da escola regular. Como já foi observado, alguns profissionais não se sentem preparados para lidar com essas crianças e, basicamente, querem se livrar delas.



Inclusão ou integração?

Uma questão básica a respeito da educação/escolarização de crianças autistas é que não basta mandá-las para uma escola regular e achar que com isso a inclusão está resolvida. Existem evidências de que se as crianças não forem preparadas e, principalmente, se as escolas não forem preparadas, a inclusão não vai funcionar. A escola regular precisa receber contribuições de profissionais especializados em autismo; de preferência, profissionais que já tenham tido alguma experiência prática. A escola regular local e a escola especializada (ou outros ambientes especializados em autismo) podem, e deveriam, realizar intercâmbios entre profissionais para que seus conhecimentos específicos sejam compartilhados. 


Se uma criança vai para a escola é para que receba educação, para que seja escolarizada. Temos que ter certeza de que ela está, de fato, sendo educada naquele contexto. Se isso não acontecer, não é inclusão.


O que se tem quando a “inclusão” é conduzida sem preparação, é o que se chama de integração; normalmente o que chamamos de integração de localização. Ou seja, as crianças estão ali fisicamente, mas não estão incluídas. 


Elas podem não estar incluídas por diferentes razões. Podem não estar plenamente incluídas no currículo e podem não estar incluídas nas atividades sociais. Nesses casos, elas são mais como uma visita tolerada e podem não ser realmente parte da escola. Portanto, integrar não garante a inclusão.

 

Hoje, no Reino Unido, muitas escolas estão sendo avaliadas com base no resultado de provas. Quando elas têm no seu meio crianças com autismo ou com qualquer tipo de dificuldade de aprendizagem, com frequência dão um jeito de excluir essas crianças para que seus resultados não apareçam nas estatísticas. Isso acontece especialmente no caso de crianças autistas que também apresentam comportamentos desafiadores. Esta, obviamente, é uma situação inaceitável e um escândalo que o governo vem tentando resolver. Mas o que esse tipo de situação revela, antes de mais nada, é a falta de cuidado que continua existindo em relação a essas crianças e ao modo como são atendidas.


O que é uma escola inclusiva?

Inclusão significa mudar, adaptar o ambiente para adequá-lo ao indivíduo. Na verdade, a escola inclusiva é aquela que atende a todos. É a escola que, desde o seu planejamento, na implementação do seu currículo, em todas as suas ações, supre as necessidades de todos os seus alunos. É a escola que se compromete a fazer as devidas adequações quando surgem necessidades muito específicas como acontece no caso do autismo.



E se a escola não inclui?

Quando falhamos em fazer essas adequações, o que conseguimos é aumentar a segregação. As crianças que não têm suas necessidades supridas terminam em instituições especializadas, ou então, na pior da hipóteses, acabam ficando em casa, sobretudo quando não existem instituições e serviços especializados disponíveis, o que infelizmente é muito comum. Essas crianças não estão de fato recebendo educação, mas tutoria domiciliar. No Reino Unido a tutoria domiciliar tem crescido muito entre crianças com autismo, e esse quadro provavelmente reflete o que deve estar acontecendo em nível mundial.  


Inclusão é um modo de ver a educação

É claro que a inclusão de verdade não pode ser responsabilidade de apenas alguns profissionais, sem que seu trabalho seja apoiado pelo conjunto da comunidade escolar. A inclusão também não se concretiza simplesmente porque está determinado em lei. Há um enorme trabalho de capacitação a ser feito e talvez um trabalho maior ainda para mudar o entendimento do que é uma escola, para quê e para quem ela existe.


Se a escola inteira não acolher todos os alunos, ela não será uma escola inclusiva. E a escola inteira significa todos os membros da direção, todos os professores, todos os funcionários e todo o corpo discente (com suas respectivas famílias). Todos esses atores podem não saber como trabalhar com estudantes autistas, isto é totalmente aceitável. Mas todos devem ter a disposição de aprender e buscar ajuda de quem sabe, e devem ter a convicção real de que o lugar de cada um dos alunos da escola, sejam quais forem suas necessidades, é lá mesmo, naquela escola, e em nenhum outro lugar. 

Comentarios


Design sem nome (8).png

CONTATO

contato@pandorgaformacao.com.br

+55 (51) 3509.2900 

Rua Emílio Zola, 106, Bairro Jardim América, São Leopoldo/RS - 93032-140

  • whatsapp
  • instagram
  • facebook
  • youtube
  • spotify (1)
bottom of page